segunda-feira, 17 de abril de 2017

Universitários mobilizam comunidades

*Publicado na página de Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 02/06/2016

BRENDA PANTOJA
Da Redação


Trabalho multidisciplinar, envolvimento com comunidades locais e empreendedorismo social são as maiores marcas do programa Enactus, uma organização internacional voltada para universitários, professores, empresários e executivos que acreditam na mobilização da juventude. Equipes de todo o Brasil vão se reunir no Campeonato Nacional, marcado para o mês que vem em Fortaleza (CE), para compartilhar experiências e disputar uma vaga na etapa mundial.
No Pará, os times estão se preparando para apresentar dezenas de projetos regionais, que prometem não só gerar impacto positivo para populações carentes, mas também contribuir para fortalecer uma rede de futuros profissionais comprometidos com uma visão mais sustentável.
Neste ano, a organização decidiu abrir ao público o evento que reúne as equipes Enactus do país inteiro. A ideia é alcançar mais pessoas e divulgar a iniciativa também para estudantes e docentes do ensino médio, que poderão conhecer trabalhos baseados nos pilares social, econômico e ambiental, voltados a empoderar e solucionar problemas específicos da sociedade. O evento é gratuito, mas as vagas são limitadas e as inscrições estarão abertas até o dia 30 deste mês no site www. enactus.org.br/campeonatonacional/ inscreva-se.
O time da Universidade Federal do Pará (UFPA) sentiu o gostinho da vitória no ano passado, quando foram premiados a Liga Rookie do Campeonato (modalidade para os projetos com menos de um ano). O projeto “Cíclica” deu o título a eles, que esse ano concorrem na liga principal, e consiste em organizar e fortalecer o trabalho dos catadores de lixo que atuam no Centro de Triagem (CT) do canal São Joaquim, no bairro de Val-de-Cans, alguns oriundos do fechamento do Lixão do Aurá. Os acadêmicos aplicam o conhecimento de diversas áreas para empoderar os catadores e torná-los agentes ambientais,gerando emprego e renda a partir da sustentabilidade.
São cerca de 30 catadores vinculados à Associação de Catadores de Coleta Seletiva de Belém (ACCSB), sendo que 58% do público é masculino e a faixa etária é entre 18 e 63 anos. Os integrantes Enactus UFPA formulam estratégias para melhorar o processo da triagem, ensinando técnicas de gestão interna, estudando a logística da coleta e a cadeia produtiva, buscando um comprador final que valorize mais o produto. O líder da equipe e acadêmico de Geologia, Rosinaldo Silveira, 24, detalha os objetivos nas três esferas que embasam o programa.
“Ambientalmente, o projeto visa ampliar e otimizar essa rede de coleta de resíduos, tirando esse material poluente da rua. Economicamente falando, nossa meta é aumentar a renda mensal deles, que hoje gira em torno de R$ 500 para R$ 880. No lado social, identificamos que a maioria dos catadores não tem ensino médio e alguns não sabem ler. Queremos agir nesse âmbito também, promovendo educação para eles”, explica.
A diretora de Projetos e estudante de Direito Érica Rodrigues, 20, lembra que a aproximação com a comunidade exigiu certo tempo, mas respeitar a autonomia deles foi fundamental para ganhar a confiança e conseguirem trabalhar juntos.
Uma das vantagens, segundo ela, é que a associação é bem organizada juridicamente e isso já garantiu alguns avanços antes mesmo da equipe entrar com a assistência. “Recentemente, eles ganharam uma cozinha e material de escritório, além de estarem participando de um edital nacional que os premiará com R$ 10 mil se fizerem algumas adequações no CT até o fim do prazo”, conta. Érica diz que os catadores estão conseguindo cumprir as exigências do edital e já fazem planos para o valor previsto como recompensa.
O desejo é aplicar a quantia na compra de mais maquinário, como uma prensa manual com capacidade superior a 180 quilos ou um triturador. “Atualmente estamos adequando o espaço para melhorar a prevenção de incêndio, orientando sobre equipamentos de proteção individual (EPIs), gestão de documentos, transparência e igualdade de gênero, entre outras ações”, acrescenta. A entidade dispõe de dois caminhões coletores e o time Enactus, ao lado dos catadores, está mapeando locais que disponibilizem materiais com maior valor agregado.
“Não adianta fazer eles reunirem, no fim do dia, uma enorme quantidade de material que vai aumentar o trabalho de triagem e não tem tanto valor comercial. É preciso pensar no que é melhor revendido e pode gerar um saldo mais positivo”, reforça. Em março, os associados passaram por uma capacitação no manuseio de lixo eletrônico, promovida pelo Instituto Gea, de São Paulo, e intermediada pelo time Enactus UFPA. De acordo com Érica, a triagem desses resíduos é um diferencial em Belém e os catadores tem um comprador de Manaus interessado nesse tipo de carregamento.
O time da UFPA tem 29 membros e 9 deles estão diretamente envolvidos com o “Cíclica”. O restante é responsável pelas áreas de marketing, consultoria, planejamento, estudo de viabilidade para outros projetos que devem ser lançados ainda neste ano. Uma das ideias em análise é o “Feira Sustentável”, que vai capacitar feirantes de bairros periféricos. “Participar dessa iniciativa é uma experiência incrível. Sempre gostei da ideia de viver a universidade além dos muros, sempre tive foco multidisciplinar e o Enactus é justamente isso. É muito gratificante unir pessoas de diferentes saberes com o mesmo objetivo, buscando um resultado que vai beneficiar outros”, diz Érica.

Capacitação é fundamental para sucesso de empreendimentos sociais

O termo “ibiratã” vem do tupi-guarani e significa “madeira forte”. Foi o nome que o time Enactus da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) escolheu para o projeto carro-chefe deles. Há pouco mais de um ano, os integrantes investem no planejamento de ação e na sensibilização da comunidade que forma a Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis Visão Pioneira de Icoaraci (Cocavip). A proposta é capacitar e melhorar a geração de renda para 20 homens e mulheres, diretamente, dando outro destino aos paletes (estrados de madeira utilizados para movimentação de caixas em mercados).
A líder do time, Victória Terasawa, 18, estuda Engenharia Ambiental e pontua que os paletes de madeira são comumente descartados por empresas e indústrias da Região Metropolitana de Belém (RMB) e muitas vezes são queimados, poluindo o meio ambiente. Através de treinamentos, os catadores poderão produzir móveis, reutilizar outros materiais e ter um ganho bem maior do que R$ 0,30 por um quilo de ferro, por exemplo. A mobília produzida com baixo custo também será acessível a pessoas de baixa renda.
Composto por 41 estudantes, o time avalia parceria com o Curro Velho para a realização das oficinas. “Eles têm um certo receio de investir em uma nova atividade e nós estamos respeito o processo de decisão dos cooperados. Até porque nosso desejo é seguir trabalhando com eles, ensinar mais sobre empreendedorismo sustentável e futuramente ajudar na melhoria da creche que eles mantêm”, adianta
Victória. A expectativa é que dentro de mais um ano eles estejam produzindo e lançando uma linha de móveis e o projeto foi contemplado no edital de financiamento da Ford College Community Challenge.
A professora Natália Barbosa é a conselheira do time e destaca outros dois projetos em andamento. Na escola estadual Almirante Tamandaré, no bairro da Marambaia, colocaram em prática desde fevereiro o projeto “Geração Sementes do Amanhã”. São atendidas 300 alunos entre o 1º e o 5º ano do ensino fundamental. Os pequenos estão aprendendo a cultivar hortas orgânicas e aprendendo sobre cuidado com o meio ambiente, benefícios de uma boa alimentação e combate ao desperdício. Cerca de 200 mudas estão plantadas no colégio e na UFRA, de hortaliças, tubérculos e plantas frutíferas.
O mais recente é o projeto “Aquarela”, que vai beneficiar os moradores das comunidades afetadas pelo naufrágio da embarcação com cinco mil bois em Barcarena, em outubro do ano passado. “Ainda
não podemos dar muitos detalhes, pois envolve a patente de um produto novo, mas o foco é melhorar a qualidade de vida desses habitantes, que foram profundamente atingidos. O consumo de água, a pesca e o turismo sofreram grande impacto”, resume a professora. A equipe está animada para expor os três cases no Campeonato Nacional, mesmo que estejam em fase inicial, pois consideram o feedback dos jurados de grande ajuda.
O Pará conta com nove times em universidades públicas e privadas principalmente na capital e em Santarém, segundo o coordenador regional do Enactus Diego Lins, 24, formando em Engenharia Ambiental pela Ufra. “O envolvimento tem crescido a cada ano e os projetos estão se consolidando, gerando uma competição saudável e resultados expressivos, com grupos avançando no campeonato e,
mais importante, promovendo transformação social”, afirma. A pluralidade cultural e as carências da região contribuem para uma ampla possibilidade de projetos.
Caio Moura, gerente do programa Enactus Brasil, salienta que “os empreendedores sociais na Amazônia que recebem o estímulo da Enactus Brasil aceleram o processo de mudanças e inspiram outros atores a se engajarem em torno de uma causa comum, engajados na busca por tendências e soluções inovadoras para desafios sociais e ambientais”. O evento nacional incluirá o I Simpósio de Empreendedorismo Social Enactus Brasil e os interessados em participar podem submeter artigos para serem apresentados em forma de banner até dia 20 de junho, pelo site www.enactus.org.br. Neste ano, serão 48 projetos apresentados representando 48 universidades de 14 estados brasileiros.

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