quinta-feira, 23 de março de 2017

Projeto combate violência na Sacramenta


*Publicado na página de Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 21/04/2016

BRENDA PANTOJA
Da Redação


Com mais de 44 mil moradores, o bairro da Sacramenta, em Belém, tem uma grande população jovem. Dados do Censo 2010 mostram que o número de habitantes, na faixa etária de 5 a 19 anos, gira em torno de 10.753 pessoas. Visto como um dos bairros mais perigosos da capital paraense, a administradora Rita Pantoja decidiu tomar uma iniciativa para combater os índices de violência da área. Há 17 anos, ela fundou a Associação Projeto Renascer, apostando na qualificação, educação, esporte, lazer e cultura como ferramentas para melhorar a vida de crianças e jovens.
O trabalho é realizado por meio de projetos como o Ciranda da Arte com Ballet e Ciranda da Arte com Futebol, que atende crianças entre 6 e 12 anos. As meninas e os meninos não só treinam ballet e futebol, como também realizam atividades de pintura e leitura. Já os projetos Menor Aprendiz e Capacitação para Geração de Emprego e Renda são voltados para adolescentes e jovens, respectivamente. A associação também recebe adultos em busca de qualificação e os cursos ofertados são de atendimento ao público, vendas e marketing, recepcionista, auxiliar de departamento de pessoal e estoquista, em parceria com Serviço Brasileiro de apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac).
Em quase duas décadas de funcionamento, a entidade atendeu cerca de seis mil famílias e atualmente tem 80 integrantes. A sede fica localizada na travessa Alferes Costa, próxima ao canal São Joaquim, sendo de fácil acesso para o público de bairros adjacentes, como Barreiro, Val-de-Cães, Telégrafo e Paraíso dos Pássaros. “O nosso principal objetivo é gerar um impacto positivo na sociedade e temos visto isso se refletir na queda da evasão escolar, nas moças e rapazes que entram cedo no mercado de trabalho e ganham novas perspectivas”, declara Rita.
O adolescente Gustavo dos Anjos, 17, mudou de postura após passar pelas capacitações promovidas pelo Renascer. Ele cursa o 1º ano do ensino médio e está buscando o primeiro emprego, contando com o apoio da associação. “Hoje já penso em fazer faculdade e planejar o meu futuro, antes não me preocupava com isso. Depois da Associação Renascer, procurei outros cursos e estou fazendo um aos sábados, que vai durar seis meses e vai me ensinar várias funções, como caixa de supermercado, auxiliar administrativo, almoxarifado”, conta.
Gustavo mora no Barreiro e, para ele, a falta de oportunidades em muitos bairros acaba desanimando os jovens. “Além disso, percebo discriminação com os jovens da periferia em vários espaços da cidade. Esse tipo de coisa a gente tem que vencer. Eu acredito que sou forte, que vou conseguir me sair bem e espero conseguir logo uma vaga”, ressalta. Jacilene Gama, mãe de Gustavo, foi quem o incentivou a começar a fazer as qualificações e está satisfeita com o desenvolvimento do filho. “Aqui na área falta presença do poder público, temos poucas atividades para os nossos filhos e não é bom deixar eles crescerem acostumados a estar sempre na rua, por causa da criminalidade e das drogas. Nesse sentido, o curso foi muito bom para ele se atualizar, se motivar a batalhar mesmo”, avalia.
O currículo de Gustavo foi enviado para vários parceiros da associação, que incluem redes de supermercado, de farmácia e shopping centers. “O currículo que vai encaminhado por nós tem maior credibilidade porque são parceiros que conhecem o nosso trabalho. O retorno tem sido muito bom e os alunos atendidos recebem até treinamento sobre entrevistas de emprego e dinâmicas de grupo”, diz Rita. O ponto alto do trabalho com a capacitação de adolescentes, jovens e adultos, ainda segundo ela, é ocupar o tempo ocioso, melhorando o currículo e a autoestima deles.
Focado no público infantil, o Ciranda da Arte nasceu há 10 anos com a intenção de valorizar a arte-educação. Com aulas duas vezes por semana, os professores revezam atividades de teatro, desenho, música, leitura com ballet e futebol. “Nossas crianças sofrem com a deficiência na oferta de atividades, de espaços de lazer, de uma educação mais completa. Esse projeto é uma forma de promover a inclusão delas por meio da arte e do esporte”, afirma. O Ciranda da Arte com Ballet recebe apoio do Banco da Amazônia há três anos.
No entanto, as aulas do Ciranda da Arte tem um diferencial. Nos primeiros 20 minutos de cada encontro, os educadores conversam com as crianças. Falam e ouvem o que eles tem a dizer sobre diversos temas: família, meio ambiente, escola, cidadania, amor ao próximo e espiritualidade. “Queremos reforçar valores com eles, que possam ser levados para dentro de casa, para a vizinhança, para a sala de aula. A sociedade está carente disso em vários ambientes e eles estão em processo de formação de caráter, por isso é bom investir”, observa o professor de futebol, Miguel del Valle.

Equipe comemora a formação de pessoas já atendidas pela associação

Humanização é o ponto chave da atuação do Projeto Renascer, defende a orientadora Celmira Pantoja. “A gente sente nas crianças o desejo e a alegria de fazer a dança, de praticar o futebol. Isso é muito importante para eles e para os pais também, ainda mais porque aliamos o ensino ao aconselhamento. Reforçamos bons princípios de honestidade, respeito e companheirismo”, pontua. Ela diz que é comum e muito gratificante encontrar jovens atendidos pelo projeto trabalhando em lojas, cursando universidades públicas e que vários deles se tornaram pais responsáveis, fazendo com que a associação atenda uma segunda geração de moradores.
Rita destaca que a entidade também atua em outras frentes. Tempos atrás, realizaram um projeto de ensino de capoeira e há pouco tempo implantaram o reforço escolar em matemática e leitura. A sede fica em uma casa de dois andares, mas apenas o pátio está disponível para o público e o espaço está ficando apertado, precisando ser ampliado. A programação ocorre nos dias de terça, quinta, sexta e sábado e uma arena é alugada para as aulas de futebol. A equipe é composta de cinco pessoas, incluindo os professores contratados.
“A experiência nos mostrou que não podemos depender de voluntários para coordenar os projetos e, como eles são muito importantes e priorizamos a qualidade do que é ensinado, temos educadores contratados. A professora de dança, por exemplo, é formada na área pela Universidade Federal do Pará”, acrescenta. A associação também entrega cestas básicas para pessoas de baixa renda e realiza ações educativas no bairro. A próxima na agenda será uma palestra sobre a gripe H1N1 e a presença de agentes de saúde para vacinar o público-alvo.
No momento, eles contam somente com os recursos financeiros do Banco da Amazônia, que repassa verba especificamente para o projeto Ciranda da Arte com Ballet, e doações da comunidade. Um dos maiores desejos de Rita é que a população se aproprie da iniciativa e ajude a garantir a sustentabilidade do projeto. “Mesmo com o aporte do banco, tentamos incentivar as pessoas a se engajarem, para que se apoderem desses serviços. Não é fácil, às vezes a comunidade quer se desprender dessa responsabilidade e esperar somente pelo poder público. É difícil se articular, exige muita consciência crítica, mas apostamos que vamos conseguir”, argumenta.
Maria Sales Araújo, 55, é mãe de Jenifer Raíssa Araújo, 10, que frequenta as aulas de ballet há dois anos. Ela também é avó de Pedro Vítor Araújo, 9, e Heitor Lima, 6, que fazem parte do projeto de futebol. Duas vezes por semana, ela faz questão de levar as crianças para as atividades e acredita que a sociedade poderia participar e ajudar mais a associação. “Mesmo quando tem reunião com os pais, muita gente falta. Não podemos esquecer que a união faz a força. Nós temos uma grande responsabilidade com as crianças e eu passo essa noção para eles, não deixando faltarem ou abandonarem o projeto, até porque eu vejo como faz bem a eles”, comenta.
Desde que começaram no projeto, ela notou que eles estão mais interessados pela leitura e que estão se expressando melhor. “Sem isso, as opções deles no tempo livre seria ficarem soltos pela rua? Ou presos em casa vendo televisão? Aqui eles gastam energia e aprendem bastante. É muito boa a iniciativa porque aqui faltam creches e ela faz a diferença para as mães que trabalham fora e não tem onde deixar os filhos”, complementa. Estudante do 6º ano do ensino fundamental, Jenifer pratica ballet há quase quatro anos.
As aulas começaram em um cursinho particular, mas foi ficando apertado para o orçamento da família e era longe de casa. “Fiquei feliz de poder continuar a fazer ballet porque é algo que me faz sentir alegre. Gosto muito de ensaiar, mas gosto mais das apresentações, de estar em um espetáculo”, revela. A garota já se apresentou no Theatro da Paz e em shoppings. Apesar de confessar que nunca quer abandonar a dança, Jenifer deseja ser professora. “O projeto me ajudou a ler mais, gosto das histórias do Sítio do Pica-Pau Amarelo, de poesias e de Lendas da Amazônia”, completa.

Ciranda da Arte vence edital do Banco da Amazônia dois anos seguidos

Sobre a parceria com o banco, o gerente de Imagem e Comunicação da instituição, Luiz Lourenço Neto, lembra que tudo começou com a inscrição do projeto no edital de patrocínio de 2014. O Ciranda da Arte com Ballet foi aprovado na seleção em dois anos seguidos e, neste ano, o apoio continua porque a empresa julgou interessante manter a continuidade da ação social. “Dos nossos recursos destinados à responsabilidade social, 80% é concedido via edital e 20% vai para projetos contínuos. Dessa vez, a Associação Renascer se encaixou nessa categoria”, explica.
No entanto, ele detalha que a continuidade não é garantida por muito tempo, dificilmente ultrapassando dois a três anos. O motivo é estimular a comunidade a comprar a ideia do projeto e o ajude a rodar. Para isso, o dinheiro do edital deve ser usado na divulgação da iniciativa, na aquisição de equipamentos e pagamento de instrutores. Em 2016, o banco destinou quase R$ 2,5 milhões, valor 8% maior do que no ano passado, a 132 projetos artísticos, culturais, educativos e esportivos em toda a Amazônia Legal. Ainda de acordo com Luiz, 40% desses projetos contemplados estão no Pará. 
“Temos projetos maiores via Lei Rouanet e uma modalidade de apoio para eventos artísticos que contribui para fomentar a cultura na região. Em um momento em que muitas empresas estão diminuindo orçamento para iniciativas sociais, nós investimos mais por acreditar que temos um importante papel social, como banco inserido na Amazônia”, declara. Luiz informa, ainda, que as inscrições para o próximo edital serão abertas em agosto e que “várias possibilidades e surpresas estão sendo estudadas na área para 2017, quando o Banco completa 75 anos”.

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