segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Projeto muda realidade de Breu Branco

*Publicado na página Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 03/12/2015

BRENDA PANTOJA
Da Redação

Capoeira, aulas de reforço, dança e teatro são algumas das atividades realizadas pelas 80 crianças que
frequentam diariamente a sede do projeto Torpedos Mirins, no município de Breu Branco. Localizada no sudeste paraense, distante cerca de 415 km de Belém, a cidade tem uma média de 54 mil habitantes e é carente de políticas de assistência, educação e lazer para o público infantil. É neste cenário que se destaca a organização não governamental (ONG) União dos Torpedos de Educação Infantil e Juvenil do Pará, responsável por implantar o projeto social 18 anos atrás. Graças a uma reforma no espaço, já na fase de acabamento, eles se preparam para ampliar o funcionamento no ano que vem, quando atenderão 120 crianças e oferecerão cursos de capacitação para adultos.
A instituição conta com o apoio da Dow Corning, empresa que atua com a produção de silício metálico na região, em uma parceria que dura 15 anos. Givanildo Peres Ferreira, 34, é quem coordena o trabalho com dedicação há quase duas décadas. A experiência o permite ressaltar alguns aspectos interessantes da comunidade alcançada pela iniciativa. “O nosso principal diferencial é a aproximação com a família e as escolas. Entre 30% e 40% das famílias atendidas têm uma realidade peculiar, que é o convívio dos filhos só com a mãe. Muitas vezes, o pai é obrigado a sair do município atrás de emprego e só volta a cada três meses”, observa.
Ele explica que o acompanhamento começa no processo de seleção, quando a ONG abre o edital para o ano letivo e já tem uma lista de espera. Os voluntários visitam as casas das famílias para saber se elas se encaixam nos critérios exigidos: que a criança tenha entre 8 e 13 anos e estude na rede pública, que esteja em situação de vulnerabilidade social e que more, de preferência, em bairros próximos à sede do projeto. “Quase todas as crianças do Torpedos são de uma única escola, mas nos reunimos periodicamente com as coordenadoras pedagógicas para saber o desenvolvimento deles e elas confirmam que a diferença aparece nas notas e no comportamento dos alunos. Muitos entram aqui como repetentes e, ao final do ano,  conseguem evoluir bastante e passar de ano no colégio”, conta.
No Torpedos, o reforço escolar é das disciplinas de Português e Matemática. As crianças também participam de atividades na sala de informática e na sala de artesanato, onde a produção está a todo vapor para a peça de Natal, e de momentos de esporte e recreação. A biblioteca é um dos espaços preferidos dos meninos e meninas. Elas passam por todas as atividades, em um rodízio durante a semana, e Givanildo acredita que são os resultados que dão credibilidade ao projeto. “Trazer os estudantes para cá no contraturno da escola dá certo porque eles fazem as pesquisas e tarefas da escola na sala de informática e na biblioteca. Claro que a gente não substitui o empenho no colégio e a atenção da família, mas eles aprendem bastante conosco”, comenta. 
De 2014 para 2015, eles conseguiram passar de 60 para 80 crianças atendidas e, desde a fundação, mais de cinco mil já foram beneficiadas pelo projeto. No entanto, o coordenador da ONG gostaria de ver um maior envolvimento da comunidade local no trabalho social. “Tivemos a parceria de um empresário local para instalar os computadores, mas o engajamento ainda é muito tímido. Alguns pais ajudam na realização de eventos, mas para todas as nossas atividades temos somente cinco voluntários fixos”, diz. Para ele, a ajuda da  Dow Corning tem sido fundamental para manter a ação em andamento e crescendo. Neste ano, o repasse da empresa ao Torpedos chegou ao expressivo valor de R$ 92 mil. “A transparência na prestação de contas é o fator de sucesso dessa parceria, pois o que recebemos é realmente usado em prol de melhorias e se não fosse isso, as crianças não estariam aqui hoje”, analisa.
Os recursos foram aplicados na pintura externa e interna de toda a sede, na ampliação da sala de leitura, no reparo das infiltrações, instalação de janelas, computadores e centrais de ar condicionado. O refeitório, na parte de trás do  terreno, também aumentou e ganhou uma cozinha industrial, dois banheiros comuns e um banheiro acessível para  pessoas com deficiência. A previsão é que as obras terminem até dia 15 deste mês. Ainda no mês de dezembro, Givanildo informou que será lançado o edital do ano que vem, ofertando 120 vagas.
Além do apoio no conteúdo pedagógico, o impacto do Torpedos Mirins consiste em apresentar aos garotos e garotas novos hobbies, a possibilidade de ampliar os horizontes e de se envolver em práticas saudáveis para a mente e para o corpo. A estudante Larissa Lima Pereira, 10, listou os benefícios que o projeto proporcionou a ela. “Entrei aqui esse ano, mas já conhecia e tinha muita vontade de participar. Ficou mais fácil de entender Matemática e gosto muito quando vou para a sala de leitura e posso pegar várias revistinhas em quadrinhos”, relata. Como criança que é, ela também gosta das brincadeiras e das aulas de dança (“já aprendi um bocado de ritmo diferente”).
A menina também se destacou  nas classes de teatro e no dia 15 vai se apresentar pela primeira vez em uma peça. A estreia de Larissa vai ser na encenação de Natal, na confraternização do projeto, onde vai interpretar nada menos do que quatro personagens. Ela confessa que não precisou decorar falas, mas vai ter que ser ágil para trocar de figurino entre as cenas e está ensaiando muito.
As aulas de interpretação e dança também ajudaram João Vítor Abreu Lopes, 11, a se sentir mais confiante. Ele, que tem preferência pela capoeira e se diverte com os gibis, entende muito bem os avanços que tem conquistado por meio do Torpedos. 
“Gosto de estudar Matemática e Português, mas foi com as aulas de reforço que consegui subir minhas notas e aprendi a ler mais, antes não tinha muita vontade. Vejo que muitos colegas têm dificuldade na escola e que eu melhorei com a ajuda do Torpedos”, avalia ele, que frequenta a ONG desde os 9 anos e prefere “nem pensar em ter que sair do projeto” quando atingir a idade limite. O rendimento escolar e o desenvolvimento pessoal do garoto animou a mãe, a pescadora Ivonete Conceição Abreu, de 34 anos, que percebeu o filho mais educado e mais esperto após frequentar a ONG.
Segundo ela, João Vítor ia muito desanimado para a escola e não tinha atividade para ocupar o tempo livre. “Tudo isso que ele faz aqui, eu não teria como pagar. Agora, ele tem mais ânimo para estudar e é um garoto interessado, que gosta de tudo um pouco: capoeira, dança, carimbó, informática...”, ressalta. Uma das preocupações de Ivonete era em não deixar o filho brincar na rua, longe de sua supervisão. “O projeto é muito importante,  pois tira eles desse ambiente, onde podem se envolver com criminalidade e drogas”, acrescenta. 

Universitário hoje trabalha no projeto que o acolheu há 14 anos

O contato com a capoeira através do Torpedos Mirins foi decisivo para o voluntário Tiago dos Santos Silva, 23, que hoje está no quarto semestre do curso de Educação Física. Aos 9 anos de idade, foi atendido pelo projeto durante um ano, tempo suficiente para marcar a vida dele. Aos 11 anos, Tiago passou a integrar um grupo independente de capoeira da cidade. Com 17 anos e no ensino médio, ele estagiou na ONG, mas só há três anos é que se tornou professor fixo de capoeira da turminha, que de pequena não tem nada: ele dá aula para todos os 80 meninos e meninas, em dois dias da semana.
“O que me motiva a ajudar é o fato de ter sido ajudado antes. A gente aprende a lidar com cada um, ao longo do ano eles vão desenvolvendo a técnica, o respeito e cuidado com os outros jogadores, além da disciplina”, pontua. A paixão pela capoeira influenciou diretamente na escolha da carreira de educador físico e ele assegura que a atividade traz muitos para as crianças, proporcionando um desenvolvimento mais saudável, mais resistência física e cardiorrespiratória, além de ser uma atividade cultural.
Com a ampliação de atendimento, Tiago provavelmente terá de ir ao projeto três vezes por semana, mas isso não é um fardo para ele. “O ensino da capoeira foi uma missão que adotei. Investir em projetos como esse faz muita diferença porque se tornam oportunidades para as crianças. Ainda mais em uma cidade que só tem o Torpedos de projeto social nesse formato amplo”, complementa. Ele também integra o grupo de capoeira ACTC e tem planos de retomar as aulas gratuitas nas escolas.Todo fim de semana, 10 instrutores se dividiam entre as escolas dos bairros e davam aulas de capoeira de graça. “Reuníamos, em média, 50 alunos por escola. Tivemos que parar o projeto por falta de apoio, mas agora nos regularizamos, criamos CNPJ  e vamos voltar”, adianta. Além do grupo e das aulas, a rotina  de Tiago inclui a faculdade e o trabalho como mototaxista.

Apoio de multinacional é fundamental à ampliação do trabalho social

Em 2015, a Dow Corning repassou R$ 47 mil para a manutenção da ONG e mais R$ 45 mil para as obras de ampliação, tarefa que apoiou promovendo parcerias entre o Torpedos e o núcleo de Engenharia Civil da Universidade Federal do Pará (UFPA) para a elaboração e execução do projeto. Os valores chamam atenção, mas a colaboração também se baseia em um diálogo direto com os agentes desse trabalho social.
O apoio da empresa no planejamento da entidade permitiu tirar do papel projetos como a reforma da sede, o que possibilita um espaço para atender também adultos no período noturno, contribuindo para a capacitação da população local. De acordo com a coordenadora administrativa da Dow Corning, Ana Paula Portela, o foco do investimento social da companhia é na educação e investir na estrutura física da ONG ajuda a solidificar a atuação.
“O objetivo é tirar crianças, jovens e agora ampliando o alcance para adultos, de um ambiente de risco e trazer para um ambiente de oportunidades, com visão de futuro”, destaca. Na sede do Torpedos, serão oferecidos cursos da área de mecânica pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). 
A primeira turma terá 25 alunos e começará no primeiro semestre do ano que vem. “Essa mão-de-obra é uma demanda que a nossa fábrica tem. O curso aumenta a chance de empregabilidade, mantendo os moradores aqui, para desenvolver localmente”, frisa. Neste ano, a Dow Corning passou por uma atualização tecnológica e doou os computadores trocados para a ONG, que conseguiu estruturar a sala de informática com 15 equipamentos.
A empresa apoia campanhas pontuais no município, dependendo da relevância da iniciativa, mas Ana Paula afirma que as ações do Torpedos prometem “resultados futuros mais sólidos e mais sustentáveis”. Foi por acreditarem na capacidade do projeto que o Comitê de Relações com a Comunidade da Dow Corning decidiu aumentar o repasse nesse ano, mesmo em um cenário difícil na economia brasileira. “A empresa entende que é um trabalho que tem valor e que aplicações voltadas para responsabilidade social devem ter prioridade porque contribuem para a qualidade de vida, formam cidadãos conscientes e os profissionais que futuramente poderão somar com a companhia”, resume.

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