*Publicado na página Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 17/09/2015
BRENDA PANTOJA
Da Redação
Da Redação
E se as crianças gostassem de
matemática? A temida disciplina
deixaria de ser vista
como um bicho de sete cabeças,
melhorando o rendimento escolar
e tornando os alunos mais
seguros também em outras áreas.
É nisso que acredita o
projeto “Círculo da Matemática”,
promovido pelo Instituto TIM
em todo o Brasil há dois anos e
que começa a ser ampliado no
Pará. Oito escolas em Belém e
uma em Marabá já integram a rede.
Felipe dos Santos, de 8 anos,
cursa o 1º ano do Ensino Fundamental
na Fundação Escola Bosque
(Funbosque), em Outeiro, e
já compreende a importância
dos conceitos matemáticos para
a vida escolar. Ele sonha em ser
jogador de futebol e diz que é
preciso se esforçar nos estudos
para alcançar este objetivo.
“Matemática é o que eu mais
gosto de estudar, ainda mais
quando tem jogos e brincadeiras”,
conta. A abordagem participativa
e lúdica do projeto estimula
os estudantes a desenvolver
o raciocínio, o senso crítico e
o interesse pelo conteúdo. Felipe
é um dos 920 alunos integrantes
do “Círculo” na capital paraense.
O projeto consiste em aulas semanais
para crianças entre 7 e
10 anos de idade e com turmas
pequenas, de no máximo 10 pessoas. Não há lição de casa nem
caderno para copiar as tarefas.
O método diferenciado tem
trazido bons resultados, uma
vez que os participantes do projeto
melhoraram o desempenho
em matemática em média 7,3%,
no ano passado. Esta foi a média
nacional, enquanto Belém registrou
rendimento de 3,2%. Ainda
que o índice pareça baixo, o desenvolvimento
é visível para os
professores. Felipe e os coleguinhas
Ruan dos Santos, 8, e Luemily
Borges, 7, fazem questão de
responder às tarefas no quadro
e de interagir com a professora
Manoela Franco, educadora do
“Círculo” na Funbosque. “Eu gosto
mais das aulas de Português,
mas agora eu também gosto
quando tem aula de matemática
porque a gente aprende muita
coisa legal”, afirma Ruan, com a
sinceridade e a simplicidade característica
das crianças.
A ideia é atacar o problema na
raiz e combater a realidade mostrada
pelos levantamentos do Ministério
da Educação (MEC), que
mostram que apenas 42% dos
alunos do 3º ano do ensino fundamental
dominam operações
simples como adição e subtração.
“Muito se fala na necessidade de
melhorar a qualidade da educação brasileira, mas pouco se faz
para melhorar este cenário. Os
primeiros anos de formação acadêmica
são fundamentais para
definir a trajetória escolar do aluno”,
defende o coordenador do
projeto no Brasil, Flávio Comin.
Ele explica que a “pedagogia
estruturada” utilizada pelo
“Círculo da Matemática” foi desenvolvida
por Robert e Ellen
Kaplan, professores da Universidade
de Harvard, nos Estados
Unidos. Para a implantação do
projeto, cerca de 50 educadores
de todas as regiões foram selecionados
e enviados para fazer
o treinamento com os criadores.
Neste ano, a iniciativa entrou
em uma nova fase e começou
a realizar formações ministradas
pelos professores treinados
inicialmente. O público-alvo é
composto por docentes da rede
pública e a meta é formar 1.800
profissionais em 20 cidades, até
o fim deste ano.
Comin reforça que a estratégia trabalha não apenas a habilidade
de contar dos alunos, mas
os faz pensar de forma independente.
“O Círculo vai além disso
e desmistifica o erro. Ao trabalhar
a cooperação e valorizar o
envolvimento do aluno, isso faz
com que ele perca o medo de errar e aprenda a atuar em equipe.
Neste sentido, tem um viés de cidadania,
pois estimula o pensar
lógico e o pensar cidadão”, pontua.
O efeito das aulas matemáticas é refletido no desempenho
escolar e na comunidade onde o
aluno está integrado.
“O estudante, especialmente
aquele que passa mais de um ano
no projeto, tem menos chances de
abandonar a escola e, consequentemente,
melhores perspectivas.
A matemática ficando mais acessível,
também melhora a imagem
do ambiente escolar”, observa. O
coordenador do projeto diz, ainda,
que esta mudança de postura
vale até para os pais que não tiveram
boas experiências com os
estudos, pois deixam de pensar
na escola como um lugar de fracasso,
mas sim de êxito.
Sobre as particularidades
do “Círculo da Matemática” no
Pará, Comin menciona as dificuldades
enfrentadas pela educação
em um estado tão vasto.
“A região Norte como um todo
apresenta índices educacionais
sistematicamente piores, daí a
importância de investirmos no
setor e ampliar o projeto nessa
área”, argumenta. No entanto,
ressalta que o Pará não tem ficado
para trás nos resultados
alcançados pelo programa, obtendo
bons índices assim como
o restante do país, levando em
consideração a quantidade de
crianças atendidas.
Funbosque envolve 79 crianças no “Círculo da Matemática”
Na sala de aula, o carinho
com a professora Manoela Franco
é grande por parte de todos
os alunos. Ela é uma das educadoras
que, através do projeto,
ajudam a construir uma visão
mais positiva sobre o ensino
da matemática e a educação
no geral. Licenciada em Física e
Matemática, ela viu na iniciativa
a oportunidade de fazer mais
pela comunidade em que trabalha
e atualmente é a responsável, sozinha, pelas 79 crianças
– divididas em oito turminhas,
do 1º ao 4º ano - integrantes do
“Círculo” na Funbosque. Em 45
minutos de aula, ela envolve
os estudantes em problemas e
brincadeiras, sempre fazendo
com que a resposta venha deles.
“Eles não vêm apenas para
sentar, ouvir e copiar. Tento extrair
a solução deles, sem acusar
quando respondem errado e
perguntando o porquê daquela
resposta”, destaca.
Uma vez por semana, os estudantes
são liberados durante
um horário para assistir à aula
do projeto. O padrão é que as
aulas aconteçam no contraturno,
mas esse formato não
funciona na Funbosque, pois
muitas famílias moram longe.
“Converso com a professora
deles para saber o conteúdo e
o nível de aprendizado. Deixo
o conteúdo por conta dela e nos
concentramos nas tarefas e
dinâmicas com eles”. Manoela
também ensina turmas do nível médio e conseguiu dinamizar
a aula dos alunos maiores
também, ainda que não sejam
o público-alvo do projeto.
“Muitos já chegam no fundamental
II e no médio dizendo
que não gostam de matemática e
que não serve para nada. É bom
mudar isso logo cedo, para não limitar
o aprendizado lá na frente”, frisa. Os efeitos não passam despercebidos
pelos responsáveis. A
dona de casa Angélica Oliveira,
39, é mãe de Ísis Martins, 8, e deseja
uma boa trajetória acadêmica
para a filha. “Mesmo com dificuldades
na matéria, ela está ficando
mais interessada em superar e
está indo muito bem. Para mim,
a matemática e a física foram um
peso, mas para ela quero que seja
diferente”, conta.
O extrovertido Ruan dos
Santos recebeu muitos elogios
da mãe, que está contente com
o comprometimento do filho
na escola. “Ele já é um ótimo
aluno, gosta de estudar principalmente
Português, mas notei
que ele está com mais vontade
de estudar matemática. Acho
ótimo, pois é um conhecimento
essencial para tudo e quanto
antes a gente acabar com isso
de detestar essa matéria, melhor
para as crianças”, opina.
“Etnoconexões” utiliza a cerâmica para ensinar elementos geométricos
Em Belém, o “Círculo”
também funciona nas escolas
municipais Amância Pantoja,
André Avelino Piedade, Josino
Viana e na escola estadual Jonathas
Athias. A Secretaria Municipal
de Educação (Semec) é
parceira da iniciativa e também
mantém seus próprios projetos
que colaboram para estreitar
os laços dos estudantes com a
matemática. Na Escola Liceu de
Artes Mestre Raimundo Cardoso,
no distrito de Icoaraci, o
projeto “Etnoconexões entre a
arte e a matemática” utiliza o
saber local empregado no artesanato
da cerâmica para ensinar
os elementos geométricos
aos alunos.
Idealizado pela professora
Rosângela Dantas, ele está
em execução há seis anos e já
envolveu cerca de 420 alunos,
sempre das turmas de 8º ano
do ensino fundamental. “Temos
aulas teóricas e práticas,
com oficinas de cerâmica, de
educação patrimonial e expressão
gráfica. Ao envolver
arte e cidadania, damos um
novo significado à matemática
e o resultado vem na vontade
de aprender, de fazer parte
das aulas”, relata. Segundo ela,
a retenção de estudantes pela
disciplina ficou mínima desde
que o projeto foi implantado.
Para ela, o trabalho precisa
começar pela conscientização
dos professores de buscar novos
caminhos para desconstruir
este bloqueio. Este é o
papel do programa Alfamat,
também da Semec, que trabalha
alfabetização, matemática,
leitura e escrita. Elaborado pelo
Centro de Informática Educativa
(NIED) da secretaria, ele
existe desde 2009 e inclui 345
professores. Capacitando os
educadores do 4º e do 5º ano,
o programa beneficia em torno
de 11.758 alunos. Por meio
de oficinas, os docentes têm
a formação reforçada. Só em
matemática, são trabalhadas
28 habilidades. “Desde geometria
e leitura de tabelas até medidas
de comprimento, muitos
professores que aprenderam
matemática de forma mecânica tiram dúvidas, aprendem
métodos e vão para a sala de
aula mais seguros”, salienta
Odinéia Lopes, assessora pedagógica do Alfamat.
A primeira preocupação é
contextualizar os problemas e
incentivar a diversidade de estratégias,
sem se prender a só
um caminho para encontrar o
resultado correto. O conteúdo
visto no programa é aplicado
aos alunos na Prova Belém,
que serve, com base nos resultados
individuais, para diagnosticar
onde o aluno está
tendo dificuldades no aprendizado.
A avaliação é bimensal
e nos exames já aplicados neste ano, a média de acertos
dos alunos do 4º ano subiu de
41% para 50%. No 5º ano, o índice
foi de 52% para 54,6%. “Parece
um crescimento pequeno,
mas indica um avanço e nós
queremos resultados cada vez
melhores”, completa.
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