quarta-feira, 10 de junho de 2015

Projeto leva economia justa a Cotijuba


*Publicado na página Responsabilidade Social, no jornal O LIBERAL de 31/07/2014

BRENDA PANTOJA
Da Redação

      Um galpão pequeno, onde se pode ouvir o barulho que o vento faz nas folhas das árvores, é o ambiente de trabalho da artesã Danielle Conceição, 34. Com as mãos ágeis, ela manipula os fios que depois serão usados para compor as biojoias e bloquinhos de papel reciclado produtos do Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (MMIB). A sede da entidade fica na ilha de Cotijuba, localizada a 40 minutos de barco da capital paraense, e vai ser o ponto de distribuição de artesanato regional para todo o país, via internet.
      Esta é a proposta do projeto Amazônia Justa, desenvolvido pelo MMIB em parceria com o Instituto Brasil Justo e com apoio da Petrobras. Em andamento há quatro meses, a primeira fase do projeto está terminando e consiste na realização de cursos, oficinas e compras de maquinários. O cronograma prevê a inauguração da loja virtual em fevereiro de 2015, no site www.istoesustentavel.com.br. Até lá, serão realizados eventos e exposições para divulgar a iniciativa. 
      Danielle aprendeu a confeccionar os acessórios a partir das folhas de priprioca, bananeira e sementes em 2009, quando se associou ao movimento. “Fazia algumas peças de crochê antes, mas, por distração. A partir do curso de biojoias vi que tinha um outro caminho, uma outra forma de ganhar dinheiro sem ter que ir para a cidade”, conta.
        Ela morou em Belém por cinco anos, para estudar, mas não pretende deixar a ilha novamente. “Aqui o ritmo de vida é outro, a gente trabalha com tranquilidade”, acrescenta. A artesã se divide entre o trabalho em casa, com os dois filhos adolescentes, e a ajuda no MMIB. “A gente sempre está produzindo, às vezes mais, às vezes menos, mas sempre tem peça para vender. As ações do Movimento tem atraído bastante público jovem, e eu que sou mãe fico de olho nisso, porque aqui os jovens não têm muita ocupação”, afirma. Além do Bolsa Família, que recebe mensalmente, ela complementa a renda familiar com o valor repassado pelo projeto para os integrantes, que varia
entre R$ 300 e R$ 500. 
        Segundo a coordenadora administrativa do MMIB, Adriana Lima, o Amazônia Justa é composto por seis mulheres e um homem, enquanto o Movimento conta com 68 associados. A entidade existe há 15 anos e promove outras iniciativas, como o projeto Vida e Companhia, que atende cerca de 100 idosos; o projeto Amazônia, que oferece cursos de empreendedorismo para 35 jovens entre 16 e 21 anos; e a conservação da planta ucuuba. O MMIB tem, ainda, um centro de inclusão digital, com aulas semanais de informática e formação de 20 pessoas por trimestre, além da sala de leitura, único espaço do tipo na comunidade.
       “Trabalhamos com biojoias há cinco anos, através de uma parceria com o Instituto Peabiru e a Mapinguari Design, mas a produção de papel artesanal começou em 1999. Agora, com o Amazônia Justa, é que juntamos os dois para comercialização e o principal objetivo é trabalhar, mas sem ter que sair de Cotijuba para vender”, explica. 
       O Movimento já recebeu uma prensa e uma guilhotina industrial, e aguarda uma máquina de corte e vinco. Com o reforço no maquinário, eles conseguem produzir, semanalmente, 100 folhas recicladas, 200 blocos de papel por semana e 50 terços, considerado o destaque do trabalho com as biojoias.  

COOPERATIVA
       Em agosto, a Fundação Curro Velho vai promover uma formação para os participantes do projeto e moradores da ilha. “Além dos acessórios, usamos as sementes e folhas de árvores também nos blocos de papel. Como iremos expandir a distribuição, esta oficina vai ajudar a trabalhar o beneficiamento das sementes e manuseio dos produtos prontos, porque precisaremos fazer estoque e surgem  problemas como umidade e mofo. Também haverá oficina sobre cartonagem e encadernação”, informa Adriana. A ideia, de acordo com ela, é formar uma cooperativa a partir do MMIB, que possa trabalhar na ilha.
      “As propostas que recebíamos era sempre de deixar Cotijuba e ir para Belém para comercializar  nossa produção, mas isso criava mais dificuldades do que ajudava, pela questão de locomoção e dos gastos”, argumenta. Com um plano diferente, o Instituto Brasil Justo já garantiu parceria com o portal www.maniadepoesia. com.br, onde os produtos são vendidos em kits.
        Ainda em agosto, uma integrante do MMIB viajará ao Rio de Janeiro para divulgar os produtos na estação de metrô do Cantagalo, que possui um fluxo de clientes superior a 30 mil por dia, o equivalente a cinco vezes a população que reside na ilha. A oportunidade servirá como um meio de avaliar a aceitação dos produtos no mercado e assim rever padrões de qualidade, atendimento, velocidade de produção, forma de pagamento mais efetuada, dentre outros quesitos fundamentais para o aumento das vendas. 
       “A partir dessa organização poderemos ter uma produção contínua. Antes dependia muito de encomendas, mas agora a demanda vai aumentar naturalmente e não apenas isso, mas o crescimento virá acompanhado de conhecimento e qualidade”, ressalta Adriana.
      Esta também é a expectativa do artesão Delson da Conceição, 32, irmão de Danielle. Ele conheceu o Movimento quando participou da oficina de papel reciclado, há 15 anos, e desde então não abandonou a atividade. “Quem acompanha o trabalho do MMIB há muito tempo, sabe o quanto esperávamos por uma chance e agora chegou essa oportunidade.  Espero que tudo continue dando certo, que a gente possa envolver mais moradores da ilha e fazer desse trabalho uma renda fixa”, reforça.  Além de produzir os blocos e folhas, que ficam prontos entre 30 minutos e duas horas, dependendo do tamanho, ele trabalha fazendo diversos serviços em Cotijuba para aumentar a renda.
          Elcicleia Fernandes, 36, também trabalha como artesã e acredita que o projeto trará resultados positivos para a juventude da região. “Assim como eles, cheguei através de um curso e descobri um  talento que não sabia que tinha. É um trabalho que gosto muito de fazer e a minha filha, de 16 anos até já aprendeu e, de vez em quando, me ajuda com as encomendas”, diz.
          Os três artesãos concordaram que a atuação do MMIB tem atraído a atenção dos adolescentes e jovens, mas por causa das atividades que envolvem máquinas e vínculos empregatícios, são poucas as atividades que eles realmente podem participar. Ainda assim, alguns ajudam no projeto de conservação do ucuuba. Eles fazem monitoramento nos viveiros, catalogam plantas e mapeiam as espécies. 

CONVÊNIO
        Por isso, Adriana adianta que a associação está buscando convênio com o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) para levar cursos do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). Sobre a trajetória do Movimento, ela pondera que foram muitos anos realizando pequenos cursos, mesmo sem enxergar como essas ações trariam, de forma concreta, grandes mudanças na realidade local. “Nós persistimos e apostamos em uma combinação importantíssima: conhecimento tradicional, produção artesanal e sustentabilidade. São 30 pessoas na entidade que vivem isso diariamente, se dedicando integralmente, e nós visualizamos que a geração de renda a partir disso não é um sonho impossível, pelo contrário, é uma realidade se concretizando”, defende. Para ela, eles nadam contra a maré ao promover um trabalho econômico e social como este, uma vez que é comum os jovens saírem de Cotijuba e percorrerem o estado atrás de oportunidade.

Portal mudará visão da população que ainda depende de bolsas do governo
      Força de vontade, técnica  e localização geográfica são as principais ferramentas de que a população precisa dispor para se conscientizar de que pode transformar a sua realidade, na visão do coordenador geral do projeto pelo Instituto Brasil Justo, Célio de Carvalho. “Isto ficará bem claro para a população quando o Projeto começar a gerar rendas maiores do que eles estão acostumados. Hoje a população está dependente de várias bolsas oferecidas pelo governo, além de empregos distantes de suas casas para se manterem. No futuro, com o andamento do projeto, isso vai mudar”, garante.
      Ele lembra que a ideia vem sendo discutida desde 2011, quando buscavam uma forma de incentivar a proteção da floresta amazônica e gerar renda para os pequenos produtores e associações locais. “O principal foco do Amazônia Justa é abrir um canal de vendas para as comunidades da Amazônia que possuem uma produção eco-sustentável e se localizam em regiões afastadas dos grandes centros”, define. 
      Segundo ele, os obstáculos encontrados, como a falta de subsídios, capacitação e renda, poderiam ser minimizados eliminando os intermediários e adotando o e-commerce. O mesmo portal também vai vender o mel produzido pela Associação de Meliponicultores de Curuçá (Asmelc) e os pacotes de turismos de base comunitária da agência de ecoturismo “La no Mangue Ecotour”. Célio de Carvalho diz que embora haja mercado para produtos sustentáveis, muitas pessoas ainda acham que são itens ruins, que apodrecem e possuem um prazo de validade curto. “Nosso desafio é aumentar a qualidade desses produtos, padronizá-los, criar um controle de qualidade e ganhar a confiança dos clientes. Para isso o projeto investe nas máquinas, cursos e realização de Procedimentos Operacionais Padrões (POPs) para cada produto”, aponta.
      O conceito exercitado pelo instituto é o da Economia Justa, que, em termos reais, é gerada quando o consumidor final paga o preço de mercado de um produto e mais de 70% deste valor vai para o produtor. Segundo ele, por meio do portal, 95% do valor da venda irá para o MMIB e os outros 5% serão utilizados para pagar o seguro virtual e impostos.

PLANO
     O instituto formatou um plano de negócios e de marketing para o projeto, que inclui a participação de artistas na fase de divulgação dos produtos, e começaram a inscrever a iniciativa em editais. No final do ano passado, o patrocínio foi aprovado pelo edital Petrobras Comunidades. “Vendendo o que os nativos produzem, criamos a possibilidade para que eles gerem renda familiar e permaneçam de forma sustentável em suas terras, protegendo-as. Aumentando a demanda das biojoias, demandaremos mais mão de obra da Ilha, gerando mais renda verde para a população local. Socioambientalmente  falando, tem coisa mais bonita que isso?”, resume. No site www.institutobrasiljusto.org.br, é possível encontrar informações sobre os outros projetos desenvolvidos pela organização.

terça-feira, 2 de junho de 2015

Obra em condomínios ficará mais cara


*Publicado em O LIBERAL de 06/04/2014

BRENDA PANTOJA
Da Redação      

     As reformas de imóveis em condomínios ficarão mais caras a partir de 18 de abril, quando as obras feitas por moradores não poderão mais ficar a cargo do pedreiro de confiança ou do profissional autônomo conhecido como “faz-tudo”, devendo ser responsabilidade de empresas especializadas. A regra vale para propriedades residenciais e comerciais, novas e usadas, e foi estabelecida pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que publicou a norma NBR 16.280 e estabeleceu um roteiro de procedimentos para condôminos e síndicos.
    A principal exigência é a elaboração de laudos, assinados por engenheiro ou arquiteto, para serem aprovados pelo síndico, que deverá consultar especialista para analisar o laudo e propor as mudanças necessárias, caso entenda que a obra oferece risco à edificação ou aos moradores. Isso vale mesmo para obras mais simples, como pinturas interiores. Os custos da contratação de profissional para avaliar a reforma e fornecer um laudo são de, no mínimo, R$ 2.500 mais a taxa de R$ 250 por hora de trabalho, conforme a tabela do Instituto Brasileiro de Avaliações e Perícias de Engenharia (Ibape). 
      No Pará, o Sindicato dos Condomínios do Estado (Sindcon) orienta, desde 2012, os síndicos a cobrarem dos moradores o planejamento das obras. Segundo o presidente da entidade, José Nazareno Lima, a ação preventiva foi adotada depois que o Ministério Público do Estado (MPE) emitiu a recomendação 06/2012, por meio da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor, exigindo os procedimentos. “Se deixar, as pessoas fazem o que bem entendem e quebram onde querem. Já era instrução nossa para eles, mas esta norma vai dar mais força e estimular o comprometimento de todos”, avalia.
      O Sindcon aconselha os administradores que denunciem aos Conselhos de Engenharia (Crea/PA) ou Arquitetura (Cau/PA) e recorram à justiça para embargar obras que contrariam as medidas de segurança. São cerca de 1.400 condomínios cadastrados na Grande Belém, de acordo com Nazareno, e ele acredita que será papel dos síndicos fiscalizar as obras. “Haverá muita reclamação, mas os moradores terão que se adequar”, afirma. O engenheiro civil e arquiteto Alexandre Ferreira, segundo vice presidente do Crea/PA, alerta que as normas da ABNT são obrigatórias e a responsabilidade do monitoramento será dos síndicos, mas diz que o órgão também poderá fiscalizar.

RESPOSTA
      “A medida surge em resposta ao acontecido no edifício Liberdade, no centro do Rio de Janeiro, há dois anos. É uma  necessidade para o setor, pois fecha o cerco ao amadorismo e vai coibir a atuação de quem não estudou para fazer essas intervenções”, reforça. Para ele, antes da regulamentação, os condôminos sentiam-se livres para fazer alterações perigosas na estrutura dos prédios, modificações que não constavam no projeto inicial e poderiam prejudicar as fundações, principalmente em prédios mais antigos. “A norma pode parecer dura quando inclui ações simples, como a pintura das paredes, mas não está errada. É comum o morador começar com uma pintura e decidir fazer outros serviços durante a reforma”, justifica.
      A arquiteta Albanice Pantoja diz que, na maioria das vezes, se dispensa a apresentação de laudos para poupar tempo e dinheiro. “É preciso conversar para mostrar ao cliente que o laudo é importante se a obra for causar alguma mudança estrutural, em alguns casos a gente até se recusa a fazer sem a supervisão de um especialista”, conta. Mesmo uma troca de revestimento pode afetar a edificação, exemplifica. “Teve um caso em que o morador queria colocar o piso de granito por cima do atual, o que iria acrescentar peso no andar. Pode parecer pouco, mas se outros moradores fazem o mesmo, representaria um peso não calculado no projeto”, esclarece. Para ela, a segurança será o principal ganho para todos.
     O professor aposentado Mauro Castelo Branco, 65, é síndico há quatro anos em um edifício na avenida Conselheiro Furtado e diz que foi pego de surpresa pela nova regra. “A gente se guiava pela conversa e pelo bom senso. O morador me avisava, assim como aos vizinhos ao lado e abaixo, mas não era obrigado a mostrar projeto técnico. Alguns até apresentavam o engenheiro ou arquiteto, mas informalmente. A norma traz mais respaldo e segurança, principalmente para o síndico, que também responde em casos de complicação na estrutura do prédio”, pontua. Ele se comprometeu a buscar mais informações sobre a norma e repassar aos condôminos, já que o prédio tem algumas reformas em andamento. “Em todos os anos que moro aqui, a estrutura nunca correu risco por causa de obras indevidas. O maior problema, geralmente, é quando os vizinhos reclamam do barulho e sujeira. Com a contratação de profissionais especializados, os custos vão aumentar e isso vai exigir negociação, se representar gastos para o condomínio”, diz ele.
    A NBR 16.280 é intitulada “Reformas em edificações – Sistema de Gestão de Reformas – Requisitos” e tem 17 páginas, com etapas a serem seguidas antes, durante e depois das reformas, assim como as responsabilidades dos profissionais, clientes e síndicos. O documento está disponível para venda no site www.abnt.org.br, no valor de R$ 67. 

Entenda a norma NBR 16.280 da ABNT
• O documento contém os procedimentos exigidos para obras (mesmo que somente no interior) em edificações novas e antigas, comerciais e residenciais. As normas passarão a valer em 18 de abril, mesmo para obras como pinturas ou troca de revestimento.
• Toda reforma deverá ser comunicada ao síndico, que poderá autorizá-la ou não.
• Todo o programa da obra deverá ser descrito em um laudo, elaborado por um arquiteto ou engenheiro.
•  Não será permitido contratar apenas um pedreiro ou pintor de confiança, mas sim empresa capacitada ou especializada, com um responsável legal pelo projeto.
• Contratar um profissional para avaliar e produzir um laudo custa, em média, R$ 2.500 mais R$ 250 por hora de trabalho
• Será responsabilidade do síndico fiscalizar se os documentos estão regularizados. Caso as normas sejam desobedecidas, ele poderá procurar os Conselhos de Engenharia ou de Arquitetura, a prefeitura ou a justiça para embargar a obra.