Da Redação
Quem visita a antiga casa do poeta paraense Antônio Tavernard, em Icoaraci, encontra o abandono. A placa em frente informa que se trata de um “casarão antigo do século passado”, mas está em ruínas e tomado pelo mato. A situação se repete com outras construções históricas do distrito, que se deterioram sem restauração. A Fundação Cultural do Município de Belém (Fumbel) diz que planeja um novo inventário do patrimônio histórico e arquitetônico no próximo ano. O último, de 1994, está desatualizado, segundo a presidente da fundação, Heliana da Silva Jatene.
A antiga Estação de Trem e o Chalé Tavares Cardoso, que abriga a biblioteca Avertano Rocha, também estão em péssimo estado de conservação. A Associação dos Agentes de Patrimônio da Amazônia (Asapam), coordenada pelo historiador e especialista em patrimônio cultural Jeancarlo Pontes Carvalho, reúne informações sobre o estado desses e de outros imóveis históricos, repassa aos órgãos competentes e cobra melhorias. Recentemente, a denúncia de que um casarão na rua Manoel Barata, entre as travessas Berredos e Andradas, seria demolido para a construção de um supermercado foi divulgada na página da entidade e teve ampla repercussão nas redes sociais. “Não há imóvel histórico com autorização para ser derrubado em Icoaraci, no máximo o local pode ser revitalizado”, rebateu a presidente da Fumbel.
Jeancarlo observa que os casarões de Icoaraci fazem parte da história do Pará. “Infelizmente, os casarões históricos da vila, assim como a grande maioria em todo o Pará, padece o descaso da sociedade, é provável que 90% estejam em péssimas condições”, avalia, ao citar a antiga Estação de Trem. A fachada indica que uma Cooperativa de Artesãos funcionou no local, mas o prédio permanece com as janelas e portas trancadas, cercado pelo mato alto. Vizinhos afirmam que uma família sem-teto ocupava o imóvel. Revitalizar os bens patrimoniais reforça a grandiosidade da cultura paraense, defende Jeancarlo. “A importância da preservação é deixar às próximas gerações essa herança, legado de um passado importante ao desenvolvimento da nossa cidade”, definiu. Ele e a presidente da Fumbel sustentam a necessidade de um relatório atualizado que possibilite acompanhar a situação dos imóveis.
“O Chalé Tavares Cardoso é o exemplo mais notório de abandono. Está cheio de infiltrações, rachaduras e algumas estruturas da casa ameaçam desabar”, denuncia Jeancarlo Carvalho. O prédio é tombado pelo município, mas o terreno ao lado, constantemente alagado, pode prejudicar as fundações da casa. A situação piorou depois que uma construção irregular em frente ao chalé obstruiu o escoamento da água do esgoto e da chuva, fazendo ela se acumular na propriedade histórica.
As obras para uma nova galeria subterrânea que comporte o fluxo do terreno deverão começar até o final do ano, anuncia Heliana Jatene. Segundo ela, a Fumbel pediu apoio à Secretaria Municipal de Saneamento (Sesan) para solucionar o problema. “O chalé precisa de providências imediatas de restauração, mas a Sesan informou que não adiantava bombear a água novamente, por isso estão estudando para definir a melhor maneira de escoar”, acrescentou. Ela explicou que a Prefeitura não conseguiu incluir o chalé entre os patrimônios tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que não aceitou a proposta sob a alegação de que o imóvel não faz parte do centro histórico de Belém.
“Este casarão, sem dúvidas, está com os dias contados. Se as secretarias responsáveis ficarem de braços cruzados, é provável que, em alguns anos, ele tombe, literalmente”, critica Jeancarlo. A indignação dos integrantes da Asapam se estende ainda à casa Senador José Porfírio, com traços do Art Nouveau que marcou o final do século XIX em Belém, mas hoje com a estrutura danificada, mato
e lixo ao redor. Ele defende que os espaços sejam transformados em pólos culturais e turísticos. “Os casarões são a prova material da nossa história e testemunho dos períodos da Belle Époque e o ciclo
da borracha que se desenvolveu no Pará”, argumenta.
INVENTÁRIO
“A atual gestão recebeu a Prefeitura sem informações sobre os bens patrimoniais do município. Para fazer esse acompanhamento é necessário elaborar um inventário e essa é a prioridade da Fumbel no momento”, informou Heliana Jatene. A ideia é convocar os cursos de Arquitetura, da Universidade Federal do Pará (UFPA) e Universidade da Amazônia (Unama), para auxiliar na elaboração do inventário, que vai abranger Belém, Icoaraci, Mosqueiro e Cotijuba. Ela informou que a proposta já foi enviada às instituições, mas não houve resposta. Não há um prazo para se iniciar o projeto e ainda será definido quais serão as atribuições de cada órgão, mas a expectativa é iniciar o levantamento no ano que vem. “No entanto, não é uma tarefa fácil e nem rápida. Somente depois do trabalho concluído poderão ser providenciadas licitações para restaurar os imóveis”, ressaltou.
A casa do poeta Tavernard, de acordo com a Fumbel, está em processo de tombamento pelo município. “O abandono muitas vezes ocorre pela falta de atitude dos proprietários. É bom lembrar que o Ministério da Cultura oferece um financiamento para os donos de imóveis históricos”, pontuou Heliana, ao apontar as denúncias de abandono e depredação como a principal forma de ajudar a Fumbel a preservar o patrimônio. As informações podem ser fornecidas pelos telefones 3230-3684 ou 8733-3929.